Fernando Martins Zaupa. Promotor de Justiça no Estado de Mato Grosso do Sul.Especialista em Direito Constitucional .

sábado, abril 09, 2011

Falta de maturidade, ausência de rigor punitivo ou sentimento de imortalidade?

 
Muito se fala da falta de maturidade, respeito e senso moral, perante aqueles que não observam os direitos de pessoas portadoras de necessidades especiais e idosos.

Como sempre estou a apregoar em meus textos, triste observar, em gestos comezinhos do dia-a-dia, que o ser humano precisa – e muito – submeter-se a um sistema de regras e coerções, para que haja o que deveria – em essência e sonho – ser o correto para a vida em sociedade.

Se é certo que muitas das condutas consideradas altruístas ou meramente respeitosas com o semelhante deveriam exsurgir de natural sentimento e ação quase que espontânea, também é certo dizer que, infelizmente, parcela significativa da população, por diversos fatores, somente assim o agem em razão da obrigatoriedade de conduta ou regramento para omissão (não fazer algo).

Assim, eis que, não obstante a vida em si propiciar aos seres humanos a linha temporal que culmina na velhice e, ainda, que para boa parcela dos cidadãos do mundo alguma deficiência postar-se-á em sua vida (seja originária ou derivada...sendo que esta simplesmente pode atingir qualquer pessoa..basta estar viva e ser acometida por uma doença, acidente, etc), chega a ser vergonhoso ter que haver Leis que digam que tais pessoas devam ser respeitadas e, mais ainda, que para o caso de descumprimento desse dever haja punições e sanções.

Aliás, mais gritante e desanimador é ver que, mesmo com a chamada de atenção e punições pré-estabelecidas, alguns seres que se consideram humanos não estão nem aí e simplesmente descumprem tais leis, como se a existência daquelas pessoas fosse errada...ou a existência da velhice e deficiência fosse um estorvo para a sua vida!

Calma, lá, parcela ignorante da população! Sua hora irá chegar, tenha certeza!

A menos que seja fulminado por uma morte instantânea e atemporal, você – desrespeitador de vidas – segundo diversos estudos científicos, dificilmente não será um portador de algum tipo de enfermidade que lhe propicie limitações e lhe ensejem especiais cuidados ou, no mínimo, chegará em idade em que tais limitações e necessidades serão inerentes à sua condição de vida...ou seja, a velhice!

Já ouviu falar – caro Neandertal da vida moderna em sociedade – que a vida é praticamente cíclica, onde nascemos banguelas, com visão limitada, carecas, sem noção e controle de nossas ações fisiologicas e condutas, e, após ‘quase uma vida jovem e adulta’, caminhamos ao ocaso dela com a perda dos dentes, dificuldade da visão, a queda dos cabelos, os descontroles das ações fisiológicas e as dificuldades de exteriorização e racionalização das condutas?
É...

E quando chegar essa sua velhice ou sua deficiência, o que você, fã de Highlander, irá esperar?

Irá torcer para que não haja também, em seu caminho, um brutamontes ou desumano como você, para não respeitar a Lei, não respeitar seus direitos, não respeitar você?

Caros leitores, eis que em apenas 3 (três) meses, só no município de Campo Grande-MS, mais de mil (respira-se..ufa..sem xingamentos..) indivíduos foram notificados por uso indevido de vagas especiais! (vide: notícia).

Nesse mundo de lançamento diário de informações, nenhum brasileiro, poderá alegar desconhecimento de tais deveres de respeito, mormente com a maciça campanha sobre o Estatuto do Idoso ou leis de respeito aos portadores de necessidades especiais.

Questões de punições e sanções à parte (particularmente, acho leves as sanções previstas e absurdamente escassas as punições ante as diminutas fiscalizações realizadas), poderia ser apregoado que o cidadão de bem deveria também contribuir, fiscalizando e cobrando atitudes dos próprios transgressores.

Mas, o mundo anda tão estranho não é mesmo... Até mesmo gestos de cobrança de postura civilizada estão sendo coibidos por esses covardes...

Recentemente, em diversos meios de notícia, houve discussão sobre a falta de respeito a tais vagas, ante a informação de que um delegado de polícia teria agredido um cadeirante, quando esse teria o interpelado sobre o uso indevido da vaga especial (vide: vídeo)

Em outra notícia estarrecedora, um cidadão, que é pai de uma portadora de necessidades especiais, ao ver uma pessoa forte e saudável utilizar indevidamente uma vaga e por isso o repreender, foi covardemente espancado por ele, chegando a ter traumatismo craniano pelo ‘nada deficiente’.

As cenas do desrespeito (parada na vaga especial) e agressão, são claras e infelizmente demonstram a que grau de falta de vergonha e senso moral estão a chegar tais transgressores (veja: vídeo2)

 Certa vez, em conversa com o colega Renzo Siufi (atuante promotor da capital sul-mato-grossense), em digressão sobre a sensível perda e inversão de valores por parcela significativa da população, ele me dizia que em um país de reconhecida ‘maturidade social’ (esqueci-me qual, perdoem-me a falha), um conhecido seu (brasileiro) que lá estava a residir, por ocasião de determinado evento, saiu cedo de casa para garantir vaga no estacionamento do lugar.

Assim, tendo chegado horas antes, viu que praticamente não havia carros estacionados próximos ao portão principal e, feliz da vida, parou seu veículo a poucos passos da entrada.

Após o término do evento, ao sair do estádio na companhia de alguns colegas ‘nativos’, foi se despedindo, ao ver que todos tinham deixado seus carros em vagas razoavelmente afastadas da sua.

Ao ver que todos o olharam com certo ar de estranheza, ele mandou um ‘é que cheguei bem cedo’.

Então, eis que explicaram ao brazuca, que eles também haviam chegado cedo e, por isso mesmo, pegaram vagas um pouco mais afastadas, já que as mais próximas deveriam se destinar a quem realmente precisasse, como portadores de necessidades, idosos ou mesmo aos que por algum motivo tivessem imprevistos e por isso chegassem atrasados.

Fiquei pensando nessa estória e nas nossas, acima exemplificadas....

...e como dói a alma saber que – se forças elevadas assim permitirem – chegada a velhice, estando nesse nosso Brasilzão, terei que chegar extremamente cedo, caso queira uma vaga próxima a porta do espetáculo....mesmo que esteja escrito ‘preferencial’, ‘especial’, ‘para idosos’...ou outra informação ‘prevista em lei’.

Malditos trogloditas imortais!

3 comentários:

  1. "Já ouviu falar – caro Neandertal da vida moderna em sociedade – que a vida é praticamente cíclica, onde nascemos banguelas, com visão limitada, carecas, sem noção e controle de nossas ações fisiologicas e condutas, e, após ‘quase uma vida jovem e adulta’, caminhamos ao ocaso dela com a perda dos dentes, dificuldade da visão, a queda dos cabelos, os descontroles das ações fisiológicas e as dificuldades de exteriorização e racionalização das condutas?"
    Parabéns.Ontem minha mãe foi brutalmente agredida, porque estacionou, por ser idosa, em uma vaga de idosos.
    Parabéns pelo excelente artigo
    Obrigada,
    Elane
    Em tempo:minha mãe está bem porque foi prontamente atendida.

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  2. Cara Elane,
    energias positivas para sua mãe, em sua recuperação, perante tanta violência (física e moral!).
    Onde iremos parar, não é mesmo!?
    Infelizmente o texto é retrato da realidade, a qual você e sua mãe também infelizmente vivenciaram.
    A esperança reside - como costumo afirmar - na perseverança e atitude dos bons!
    A divulgação de idéias e possíveis influências já são uma centelha, na luz necessária a manutenção da vida em sociedade!
    Obrigado pelo comentário.
    Abraços
    Fernando M.Zaupa
    Campo Grande-MS
    www.considerandobem.blogspot.com

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  3. Fraturei o pé esquerdo em dezembro de 2010 e posso afirmar que estive deficiente por mais de dois meses e meio, em virtude do engessamento,
    e, depois, das dores terríveis que sentia durante o período de fisioterapia.
    Encontrei pessoas boníssimas e pessoas de péssima índole.
    Só pude identificá-las, como tais, por estar deficiente mesmo.
    Dependente de todos.
    Insegura física e emocionalmente.
    Agora, precisarmos de leis que façam com que as pessoas sejam educadas, parece-me o fim.
    E é o que ocorre.
    Além do mais, somos de país de tradição católica. Todos conhecem os Dez Mandamentos recebidos de Deus por Moisés.
    Não precisaria mais nada.
    Bastaria segui-los.
    E porque "o homem é o lobo do homem" precisamos de uma legislação complicadíssima, e sejamos sinceros, algo como que inútil.
    Enquanto o coração humano não vier à tona,
    enquanto não florir a alma, enquanto não desabrochar a primavera no profundo do mais profundo de cada ser humano...assim será!
    Infelizmente!
    Que seu artigo toque o coração de muitos!
    Brilhe sempre a sua Luz!
    Obrigada,
    Eliana Crivellari

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